Mesmo com desafios, ensino privado se adequa ao ensino médio, rede pública não
Ao contrário das escolas públicas, em termos de estrutura e recursos financeiros, a rede de ensino particular não teve grandes desafios para se adequar ao novo ensino médio. Em 2022, o método de ensino passou a vigorar em todas as escolas do país. Na avaliação de gestores, porém, a reforma impôs desafios de ordem profissional e ainda há muitas lacunas a serem preenchidas.
“Não existe nenhuma transformação na educação que seja 100% positiva ou 100% negativa. Enquanto o novo Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) não se estabelece, a gente não tem liberdade de poder dizer se vai precisar se aprofundar mais ou menos nas matrizes. Então isso é o aspecto negativo”, avalia Marcos Raggazzi, coordenador pedagógico do Bernoulli.
A rede de ensino se antecipou ao calendário limite estipulado pelo Ministério da Educação (MEC) para iniciar a transição. “O que fizemos foi implementar no ano de 2020 as reformas que a maioria das escolas está começando a realizar no ano de 2022”, conta. Neste período, o educador diz que foi possível dialogar com os pais e ter retorno dos estudantes do que funcionou e do que precisava melhorar.
“A formação geral básica, todos os alunos têm. Nos itinerários formativos temos a oportunidade de trabalhar a interdiciplinaridade”, acrescenta Raggazzi. Com uma estrutura de ponta, o colégio conta com teatro, estúdio multimídia e laboratórios equipados. Entre as elzetivas ofertadas pelo colégio, estão aulas de música, mídias digitais, teatro, preparação para o Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), em São José dos Campos (SP), e astronomia.
Enem incerto
Já se preparando para iniciar o último ano das turmas que fecham o ciclo do ensino médio no novo modelo, a preocupação do coordenador do Bernoulli é com o sistema de avaliação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), que ainda não tem formato de prova definido. “Teoricamente, essas matrizes deveriam ter sido divulgadas, mas as pessoas responsáveis pelo MEC fizeram uma reunião para explicar até onde eles já desenvolveram. E essas matrizes devem sair até julho deste ano”, adianta. As provas do Enem, historicamente, são realizadas em novembro.
Um dos objetivos das mudanças propostas pelo chamado “novo ensino médio”, de acordo com o MEC, é atender às necessidades e às expectativas dos jovens, fortalecendo o protagonismo juvenil na medida em que possibilita aos estudantes escolher a área de conhecimento – chamada pela pasta de itinerário formativo – pela qual desejam transitar para aprofundar seus conhecimentos. “Entre os benefícios para os estudantes estão um currículo que contemple uma formação geral, orientada pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC), e também os itinerários formativos ou as habilitações de formação técnica e profissional, de forma que possam contribuir para o maior interesse dos jovens em acessar a escola e, consequentemente, para sua permanência e melhoria dos resultados da aprendizagem”, diz o MEC.
Experiência da escolha
No Colégio Santo Agostinho, as mudanças começaram também em 2020, mas ocorreram de forma gradual. “Iniciamos com disciplinas eletivas, com o que chamamos de módulos formativos – disciplinas para que os alunos tivessem a experiência de fazer algum tipo de escolha e para que a gente tivesse experiência de flexibilização curricular”, explica o supervisor pedagógico, Petrônio Ferreira.
O educador conta que, no ano passado, a única coisa que o colégio precisou adequar foi o modelo de ensino às normas do Ministério da Educação. “O MEC sugere uma formação geral básica com 1.800 horas, no máximo, e os itinerários formativos com, no mínimo, 1.200 horas. O colégio já tinha mais de 3.000 horas no ensino médio, só que eram iguais para todos”, diz.
O primeiro ano do novo ensino médio na instituição foi com uma grade curricular dentro do padrão, porém, com muita cautela. “Nosso primeiro passo, em 2022, foi fazer uma reforma que levava em conta as premissas, mas que garantiu a segurança do nosso aluno em continuar tendo acesso ao máximo de conteúdos e habilidades possíveis”, acrescenta.
Medo do futuro
Mesmo com todos os cuidados adotados na transição pelo Colégio Santo Agostinho, o aluno Bernardo Lana, 15, se sentiu inseguro com as transformações no formato do ensino. “Foi inesperado e muito puxado. Porque a gente estava voltando do pós-pandemia on-line, que os alunos não estavam se forçando muito e descobrimos que a gente ia ter aulas a mais e com propósitos diferentes”, conta.
Ele também considera que o peso da responsabilidade de escolher uma área de conhecimento para aprofundar foi desafiador. “E se você se arrepender da área que escolheu? Como é que você se recupera? Esse tempo passou, já era”, problematiza. Na visão do jovem, o novo ensino médio tem mais perguntas do que respostas. “O Enem, por exemplo, a gente não sabe como vai ser. Pode dar tudo certo ou pode dar tudo errado.”